Por Enricco Gabriel
A tônica destes tempos é a mediocridade.
Engana-se, porém, aquele que pensa tratar-se de problema recente. O atual Brasil, cuja falida imprensa galardoa youtubers infantojuvenis semianalfabetos como intelectuais, é mero pútrido produto de outrora. Ainda no século XIX, o grande Machado de Assis denunciava, em Teoria do Medalhão, o infausto comportamento dos que — já não muito lúcidos — optavam por imbecilizar-se em troca das migalhas da aceitação pública.
O conto, publicado na Gazeta de Notícias em 1881, retrata uma conversa noturna entre pai e filho. Com tons de solilóquio, revela-se o diálogo o meio encontrado pelo genitor para aconselhar o rebento a buscar um destino estafante, mas, para os parâmetros de um guizo moral corrompido, recompensador: o de tornar-se um medalhão.
Com a maioridade alcançada, a Janjão é explicado o conceito que atiçou as ambições mais profundas de seu frustrado pai: considera-se medalhão o sujeito que, comumente a partir dos quarenta e cinco anos, é destacado dos demais por nada além do “ofício” de sustentar aparências frívolas. O passo-a-passo também lhe é apresentado. A princípio, deve o garoto abrir mão de ideias próprias e de quaisquer atividades que ensejem o independente labor intelectual — a ironia, por exemplo, há de ser abolida, posto que estimula a criatividade e o ato de pensar por si.
Imprescindível, mais adiante, uma oratória matizada por máximas, por brocardos jurídicos e por frases de efeito, haja vista que a sabedoria popular já consagrada, ao contrário do inédito, é inconteste nos círculos dos figurões. Aliás, cercar-se deles é outro ponto nevrálgico na trajetória do medalhão.
O elo último da corrente que conecta o homem comum à condição de medalhão é a publicidade. Em vez de escrever um livro sobre assunto capaz de agradar a todos, o aspirante deve lançá-lo, de forma aparentemente despretensiosa, entre seus pares mais próximos. Destarte, eles farão a divulgação franca do tópico de modo que a notícia se multiplique e, nas palavras do pai, ponha “o teu nome ante os olhos do mundo”. A pretensão paterna é tamanha que, ao fim do texto, ele compara seus conselhos àqueles que Maquiavel avulta n’O Príncipe.
Os alvos da reprimenda de Machado de Assis encontram numerosas e lastimáveis correspondências no Brasil de hoje. Em terra de medalhões, não é necessário haver mérito, mas, sim, parecer havê-lo. O país que se presta a ver com maus olhos o elogio à excelência e a crítica à mediocridade está fadado ao malogro, cultural e espiritualmente.
Diante desta conjuntura, aufere ares proféticos a Teoria do Medalhão.
Leia o conto:
Compre-o:
Imagem:
Publicado por Enricco Gabriel
Siga o JP3!
Instagram: @jornalpredio3
Facebook: fb.com/jornalpredio3
Mais notícias e mais informações:
- A Integração da Inteligência Artificial no Judiciário Brasileiro
- O clube dos low profile e fofoqueiros
- Podcast Modus Operandi
- MackStore, a loja de roupas e acessórios do Mackenzie
Jornal Prédio 3 – JP3 é o periódico online dos alunos e dos antigos alunos da Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie, organizado pelo Centro Acadêmico João Mendes Júnior e pela Associação dos Antigos Alunos da Faculdade de Direito da Universidade Mackenzie (Alumni Direito Mackenzie). Participe!
Excelente texto!!
Ótima escolha de tema!
CurtirCurtir