Por Jade Gomes de Souza
Sempre haverá bons motivos que justifiquem a saída de um exército para a guerra. Dentre os diversos fatores que o impulsiona, o principal está na possibilidade, real e iminente, de ter que se submeter às vontades do adversário, como escravos, caso seja esse o exército vencedor. Para Sun Tzu, autor do famosíssimo livro “A arte da guerra”, o verdadeiro objetivo desse combate seria a conquista e o manuseio da paz e da segurança e, para obtê-las, esse conflito seria banhado em ondas de sangue, durando, por vezes, vários séculos (IHERING, p. 12). Afinal, não há conquista sem guerra, pois, vitória sem luta é triunfo sem glória, como afirma um antigo provérbio chines.
Embora o jurista alemão Rudolf von Ihering, categoricamente, afirme que a vida, o que inclui o direito, seja uma constante luta (IHERING, p. 6), para Sun Tzu, só triunfa aquele que sabe quando lutar e quando esperar. Só saberá o momento certo de se entrar em uma guerra, aquele que, de acordo com Tzu, conhece o ambiente e o atual cenário em que vive. Sobre isso, ele afirma que os que ignoram a geografia, como montanhas e florestas, são incapazes de levar o exército adiante, ou seja, não logram êxito em seus combates por não estarem alinhados com a realidade.
Dessa forma, conhecer o cenário em que se vive é primordial antes da tomada de qualquer decisão. No que tange a essa temática, o sociólogo Émile Durkheim tem uma célebre frase, na qual alega que o indivíduo só poderá agir quando aprender a compreender seu ambiente, sua origem e as condições das quais depende. Logo, a guerra tem como um dos seus pilares o conhecimento, seja do cenário ou do adversário a ser enfrentado.
Isso posto, atualmente, o globo terrestre enfrenta uma de suas maiores guerras: o combate à desinformação. Esta, tem causado algumas dores de cabeça, exercendo influência, até mesmo, na área da saúde. A imunização por intermédio de vacinas, sendo a principal forma de combate e prevenção a enfermidades, têm sofrido ataques devido a desinformação. O pai do conservadorismo, Edmund Burke, sabiamente afirmava que um povo quando não conhece a sua história está condenado a repeti-la.
A varíola só foi declarada oficialmente erradicada em 1980, por causa da vacinação (TOLEDO). Sua existência marcou de sobremaneira a história do mundo. Causada pelo Poxvirus variolae, surgiu durante a Idade Média, juntamente com a Peste Negra, sendo responsável por várias epidemias e por milhares de mortes. Com a utilização da imunização em larga escala, foi possibilitado a diminuição drástica da incidência da doença entre os séculos XVIII e XX.
Não apenas a Varíola foi vencida nessa guerra, mas, inclusive, houve a interrupção da transmissão da poliomielite nas Américas em 1994 e a eliminação da rubéola, nessa mesma região, em 2015 (FERNANDES). Entretanto, exemplo que marcou o Brasil recentemente foi a retomada do sarampo nos estados, devido à baixa cobertura vacinal, que fez com que o país perdesse o certificado de eliminação do sarampo, que havia recebido em 2016 pela Organização Pan-Americana da Saúde. Como outrora afirmou Burker, se o povo conhecesse a sua história, ou seja, as mortes que já foram causadas pelo sarampo, talvez, a cobertura vacinal não tivesse regredido em tal proporção a ponto de, em 2019, matar, mundialmente, 207.500 pessoas (ALVES).
Uma das justificativas plausíveis dessa baixa cobertura, além da desinformação, é a ausência da percepção do risco das enfermidades para as quais já existe vacina. Dessa forma, sem conhecer a sua história o povo está condenado a repeti-la. Cabe colacionar a célebre reflexão que marcou a história: enquanto Napoleão não conhecia a geografia, Hitler não conhecia a história, visto que em 1812 Napoleão padeceu em guerra contra Rússia e em 1942, Hitler padeceu ao cometer o mesmo erro de Napoleão. De forma análoga, muitos padeceram por não reconhecerem a importância da vacina e, no hodierno, padecem os que seguem o mesmo erro daqueles que viviam no passado.
Nessa guerra, os dois lados sangram. Hoje, as ondas de sangue não são causadas por quem guerreia em busca de paz e manuseio da segurança, mas por quem, inconsequentemente, não tem conhecimento e dimensão do atual cenário em que vive. São estes que levam um exército em peso para o abismo com as suas mais variadas teorias infundadas. Com isso, sangram e morrem propagando e disseminando a enfermidade da desinformação que é, aparentemente, mais letal do que muitos vírus e bactérias.
Bibliografia
ALVES, Bruna. Altamente contagioso, sarampo matou mais de 200 mil em 2019, alerta OMS. UOL, 2020. Acessado em 05 de fevereiro de 2022, disponível em https://www.uol.com.br/vivabem/noticias/redacao/2020/11/16/sarampo-matou-mais-de-200-mil-pessoas-no-ano-passado-alerta-oms.htm?cmpid=copiaecola
IHERING, Rudolf von. A Luta pelo Direito. AVB – Agentes Voluntários do Brasil. Acessado em 02 de fevereiro de 2022, disponível em https://www.avbbrasil.org.br/diretorios/biblioteca/livros/a_luta_pelo_direito.pdf
FERNANDES, Luiz Felipe. Vacinação: entre a ciência e as fake News. Jornal UFG, 2019. Acessado em 03 de fevereiro de 2022, disponível em https://jornal.ufg.br/n/118701-vacinacao-entre-a-ciencia-e-as-fake-news
TOLEDO, Antonio Carlos de Castro Jr. História da varíola. Revista Médica de Minas Gerais, 2004. Acessado em 03 de fevereiro de 2022, disponível em http://rmmg.org/artigo/detalhes/1461
Publicado por Jade Gomes de Souza
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Jade, parabéns por mais esse incrível texto.
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