Por Larissa Sousa
A ADI 5529, ajuizada em 2016 pelo então procurador Rodrigo Janot, busca a declaração de inconstitucionalidade do art. 40 da Lei 9.729/96 (Lei de Propriedade Industrial). No dia 7 de abril de 2021 teve início julgamento da ADI em questão, mas ainda não foi apregoado, sendo que a decisão proferida pelo Ministro Dias Toffoli, que será abordada ao longo do texto, ainda será submetida para referendo do plenário. Antes de abordar o teor da decisão proferida pelo Ministro Dias Toffoli e os seus efeitos, será elaborada uma breve introdução ao assunto da prorrogação do prazo de vigência das patentes, de acordo com o previsto no art. 40, da Lei de Propriedade Industrial (LPI).
As patentes são um monopólio concedido pelo Direito, outorgando aos inventores – os quais podem ser tanto pessoas físicas quanto jurídicas – o direito de impedir que terceiros produzam, usem, vendam ou importem o objeto de sua patente. São objetos de patente a invenção e o modelo de utilidade. São objetos da patente de invenção os produtos ou processos que atendam aos requisitos postos pelo art. 8º da LPI: novidade, atividade inventiva e aplicação industrial. Por outro lado, são objetos da patente de utilidade aqueles que atendam os requisitos do art. 9º da LPI, isto é, aqueles que apresentem nova forma ou disposição que resulte em melhoria funcional em um produto. Em outras palavras, a patente de modelo de utilidade é concedida para melhorias funcionais em objetos ou produtos já existentes, enquanto a patente de invenção é concedida para objetos ou produtos inovadores por si só. Por exemplo, o inventor da tesoura, poderia ter depositado um pedido de registro de patente de inovação, enquanto o inventor da tesoura para canhotos poderia ter depositado um pedido de registro de patente de modelo de utilidade.
Dito isso, vamos agora falar sobre o processo de depósito das patentes e o tempo de vigência de cada uma delas. Para que um objeto seja patenteado, é necessário que o pedido de registro de patente (atendendo todos os requisitos postos, descrevendo claramente o objeto) seja depositado no INPI (Instituto Nacional de Propriedade Industrial), o qual é responsável por analisar tais pedidos. A vigência das patentes é contada, como determinado pela LPI, em seu art. 40, caput, são contadas a partir da data de depósito, sendo que para a patente de invenção o prazo é de vinte anos, enquanto para a patente de modelo de utilidade, o prazo é de 15 anos.
Assim, durante o prazo de vigência, o inventor depositante do pedido de registro terá o direito de impedir que terceiros, produzam, vendam, usem e importem o produto patenteado. Após o decurso do prazo, a patente deixa de vigorar e o produto passa a ser passível de produção, venda, uso e importação pelas empresas concorrentes. Entretanto, o § único do art. 40, da LPI cria a possibilidade de o prazo de vigência ser prorrogado. Tal artigo estabelece que o prazo de vigência não será inferior a 10 anos para a patente de invenção e a 7 anos para a patente de modelo de utilidade, a contar da data de concessão, ressalvada a hipótese de o INPI estar impedido de proceder ao exame de mérito do pedido, por pendência judicial comprovada ou por motivo de força maior.
O que isso quer dizer? Vamos dar um exemplo: um pedido de registro de patente de inovação foi depositado em 01/01/1997. Em 01/01/2017 a patente foi concedida, com vigência de 10 anos. Assim, se somarmos o tempo de vigência da patente contado a partir da data do depósito até a data da concessão, temos vinte anos. Entretanto, em respeito ao § único do art, 40 da LPI, o prazo de vigência não pode ser inferior a 10 anos para a patente de invenção, a contar da data de concessão. Assim, o prazo de vigência da patente totaliza 30 anos, prorrogando-se a patente por 10 anos. Aqui encontra-se o alvo de discussão da ADI 5529.

O autor da ADI, o ex-procurador Rodrigo Janot, argumenta que o prazo mínimo de dez anos poderia deixar as patentes vigentes sem prazo determinado, estimulando a morosidade do processo e prejudicando a concorrência. Do lado oposto, quem defende a legalidade do dispositivo alega que o atraso nos processos pelo INPI justifica a medida e que todas as patentes têm prazo definido, o que muda é a partir de quanto ele é contado.
Por conta do contexto pandêmico atual, a Procuradoria Geral da República solicitou urgência no julgamento da ADI em questão, a qual foi adiantada para o dia 7, como mencionado, alegando que, caso fosse decretada a inconstitucionalidade do art. 40, da LPI, seria garantido o acesso da população a medicamentos pelo SUS, os quais atualmente tem as patentes protegidas pelo dispositivo legal em tela. A oposição defende que não há medicamentos para tratamento da COVID-19 que sejam alvo de patentes, logo, a inconstitucionalidade do art. 40, da LPI, não impactaria no combate à pandemia. Sendo assim, argumentam que o objetivo visado por meio da revogação do artigo em análise é, na verdade, concorrencial, isto é, visa beneficiar empresas por meio do acesso ao mercado brasileiro.
O Ministro Toffoli decidiu pela suspensão do art. 40, da LPI, sendo que, por ser liminar, tem efeitos prospectivos, isto é, a suspensão do dispositivo legal será aplicada apenas para os novos pedidos de registro de patentes, não afetando o prazo de vigência das patentes cujo registro já tenha sido depositado ou conferido pelo INPI.
Como mencionado no início do texto, a decisão ainda será submetida ao referendo do plenário, entretanto, entendo que diante do cenário gerado pela prorrogação dos prazos de vigência, o qual foi brevemente exposto ao longo do texto, e a consequente desvirtuação da patente como instrumento jurídico, a declaração de inconstitucionalidade do § único, do art. 40, da LPI, faz-se medida necessária.
Publicado por Larissa Sousa
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O desrespeito à patente faz com que não haja interesse em investir em pesquisa e desenvolvimento. O licenciamento compulsório por razões de calamidade pública, conhecido como “quebra de patentes” e flexibilizações nos prazos de patentes fazem com que não valha a pena investir em pesquisa e desenvolvimento, uma vez que o investimento em inovação é o maior risco que existe e a patente é o que garante o retorno.
O licenciamento compulsório de remédios utilizados no tratamento da AIDS, que é o caso mais lembrado, pode ter salvado a vida de muitas pessoas que precisavam urgentemente dessas substâncias. Mas custou a vida de muitas outras pessoas com AIDS, câncer e outras doenças gravíssimas, devido à perda de interesse dos laboratórios em encontrar tratamentos mais eficazes (e até mais baratos).
A pandemia é um grande teste. Se resistirmos à tentação da demagogia e respeitarmos as patentes, veremos cada vez mais tratamentos inovadores para câncer AIDS e muitas outras doenças graves, inclusive Covid-19. Todavia, se insistirmos em cair na tentação da demagogia e continuarmos a desrespeitar patentes, precisaremos nos contentar para sempre com lixo. Um monte de vacinas e remédios com a mesma eficácia e mesmo efeitos colaterais, só que mais baratos. Definitivamente, não vermos surgir tratamentos mais eficazes e mais baratos (inclusive em relação aos similares e genéricos que surgirão com a expiração antecipada ou licenciamento compulsório por calamidade pública – “quebra de patentes”) contra a Covid-19, câncer, AIDS e outras doenças terríveis.
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