O que está acontecendo em Taiwan?

Por Fernanda Vanetti

Nas últimas semanas, a China vem impondo sanções e exercendo uma série de práticas militares ao redor de Taiwan, uma ilha a menos de 200 km de sua costa que vive sob a constante ameaça de uma invasão. Na terça-feira (9), 16 aeronaves chinesas invadiram o espaço de defesa aérea de Taiwan, que em resposta, iniciou exercícios militares com apoio dos Estados Unidos. O acirramento da tensão entre os territórios se deu no início de agosto, logo após a chegada da presidente da Câmara dos Deputados dos EUA, Nancy Pelosi, à ilha. Tal visita é vista como uma provocação ao governo chinês, que considera Taiwan como parte de seu território. Contudo, para entender as atuais divergências entre as regiões, é fundamental voltar no tempo.

A ilha de Taiwan pertenceu aos chineses desde meados do século XVII. Em 1895, a região foi cedida ao Japão na guerra sino-japonesa, sendo reconquistada somente após a Segunda Guerra Mundial, época em que ocorria uma guerra civil na China entre as tropas comunistas de Mao Tsé-Tung e as nacionalistas de Chiang Kai-Shek, que governavam o país.

Na revolução chinesa em 1949, após derrotarem os republicanos nacionalistas do Kuomintang, os comunistas tomaram o poder em Pequim. Em sua vitória, Mao Tsé-Tung proclamou o nascimento da República Popular da China, enquanto Chiang Kai-Shek e seu partido fugiram para Taiwan, implantando lá seu governo e rompendo com a China Continental. Desde então, Pequim lidera uma ditadura comunista de 1,3 bilhão de habitantes enquanto Taipei, capital de Taiwan, lidera uma república democrática de 23 milhões de habitantes.

Todavia, a China Continental não enxerga dessa maneira. Para eles, Taiwan passou a ser vista apenas como uma ilha rebelde que faz parte do território chinês. Desse modo, foi criada pelo partido comunista a política de “um país e dois sistemas”, de forma que para eles existe “uma só China”, onde são admitidos dois sistemas políticos que coabitam dentro de uma só unidade: a República Popular da China. Por outro lado, os governantes taiwaneses defendem que a ilha é um país independente e autogovernado, apesar de somente 14 nações o reconhecerem como Estado soberano.

Na verdade, em meio ao contexto de Guerra Fria, Taiwan possuía grande apoio, principalmente dos Estados Unidos, que temiam que a ilha caísse em mãos comunistas. Porém, na década de 70, a relação entre a China e os EUA mudou drasticamente ao se depararem com um inimigo em comum: a União Soviética. Nesse cenário, a Organização das Nações Unidas (ONU) reconheceu a República Popular da China como o único governo legítimo chinês e em 1979, os Estados Unidos fizeram o mesmo, precisando adotar o princípio de “uma só China” para manter relações diplomáticas com o país.

Entretanto, até os últimos anos, os EUA exerciam uma política de “ambiguidade estratégica” em relação à ilha, visto que continuaram fornecendo apoio e armamento à região e em nenhum momento romperam relações com Taiwan. Assim, os Estados Unidos nunca expressaram de maneira clara se e sob quais circunstâncias defenderiam a ilha de uma possível intervenção militar. Vale ressaltar, que em 2005 o governo chinês aprovou uma lei anti-secessão, que garante o direito do país de recorrer a “medidas não pacíficas” caso Taiwan tente a separação da China Continental.

Isso mudou com a chegada do presidente democrata Joe Biden ao poder americano, que ao contrário de seu antecessor Donald Trump, já se manifestou diversas vezes a favor da independência de Taiwan. Inclusive, no sábado (13), o Ministério das Relações Exteriores da ilha expressou “sincera gratidão” aos EUA por manterem a segurança no Estreito de Taiwan, fronteira não oficial entre os dois territórios. Além disso, nesta quinta-feira (18), o governo americano informou que serão iniciadas em setembro negociações comerciais formais entre os países.

Tendo em vista o acima exposto, é possível compreender a insatisfação chinesa diante da chegada de Nancy Pelosi à ilha, que representou uma cutucada em uma ferida já aberta. Porém, uma questão fica pendente: sabe-se que as Forças Armadas da China superariam em muito as de Taiwan, que conseguiria no máximo retardar o ataque enquanto busca apoio externo dos EUA, por exemplo. Então, por que ainda não foi iniciado um conflito militar de fato entre o país e a ilha? 

A resposta para essa pergunta está principalmente no chamado “escudo de silício”, uma estratégia que protege Taiwan de uma possível invasão chinesa. Basicamente, a ilha de Taiwan é líder mundial na fabricação de chips semicondutores, do qual o silício é matéria-prima. Esses chips, que estão em escassez, são usados em praticamente todos os equipamentos eletrônicos atualmente, de modo que Pequim, bem como a economia no geral, acaba tornando-se dependente da produção taiwanesa. Dessa forma, um ataque chinês seria extremamente prejudicial não só para Taiwan, como para os Estados Unidos e a própria China, que hoje em dia possui relações comerciais muito próximas com a ilha. 

Portanto, apesar de as tensões entre a China Continental e Taiwan estarem longe de acabar, de acordo com a maioria dos analistas, elas não irão aumentar a ponto de uma guerra. Assim, é possível, pelo menos por enquanto, ter esperança de que para a resolução dessa disputa não será necessário um conflito militar de fato.

Fontes:

Depois da visita de Pelosi, parlamentares dos EUA chegam a Taiwan em meio a tensões com a China. Publicado no G1, em 14 de agosto de 2022.

O importante papel do ‘escudo de silício’ que protege Taiwan da China. Publicado na BBC, em 16 de julho de 2021.

Taiwan agradece aos EUA por manterem segurança no Estreito de Taiwan. Publicado no G1, em 13 de agosto de 2022.

A origem da divisão entre China e Taiwan e o status atual da ‘ilha rebelde’. Publicado no BBC, em 18 de abril de 2021.

Taiwan: como a China perdeu a ilha e qual a situação atual da ‘Província rebelde’. Publicado no BBC, em 2 de agosto de 2022.

Uma visita a Taiwan e o risco de conflito entre EUA e China. Publicado no podcast Café da Manhã, em 3 de agosto de 2022.

Pelosi em Taiwan, e a tensão entre EUA e China. Publicado no podcast O Assunto, em 3 de agosto de 2022.

Taiwan: saiba qual é a história da ilha e como a tensão com a China comunista voltou a se elevar. Publicado no G1, em 9 de agosto de 2022.

EUA e Taiwan anunciam negociações comerciais bilaterais formais. Publicado na Veja, em 19 de agosto de 2022.

Imagem: DPA Via Europa Press (Europa Press)

Publicado por Fernanda Vanetti

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