No calor das velas vermelhas e pretas, entre risos soltos, pipocas estouradas e o som vibrante dos atabaques, o dia 13 de junho se acende em cores, cheiros e significados profundos.
É o Dia de Exú, entidade poderosa das religiões de matriz africana, senhor das encruzilhadas, dono dos caminhos e mensageiro entre os mundos. Celebrado com reverência por milhares de devotos no Brasil, Exú é, ainda hoje, frequentemente mal compreendido, e por isso mesmo, falar dele é também desfazer equívocos e iluminar tradições.
A CRUZADA DE EXÚ: DO MAL-ENTENDIDO À REVERÊNCIA
Durante séculos, Exú foi injustamente associado ao diabo pela visão colonizadora europeia que, ao se deparar com as religiões africanas trazidas pelos povos escravizados, impôs leituras demonizantes sobre o que era, na verdade, uma complexa cosmologia espiritual. Exú, na cosmovisão iorubá, não tem nenhuma relação com o demônio cristão. Ao contrário: ele é o primeiro orixá a ser saudado em qualquer rito, pois é ele quem “abre os caminhos“, permitindo que a comunicação espiritual aconteça.
Exú é o mensageiro entre os humanos e os orixás, o dono da linguagem, o senhor da comunicação e da troca. Sem ele, não há ritual que comece, não há oferenda que chegue ao seu destino. É por isso que, antes de qualquer pedido ou agradecimento aos orixás, primeiro se saúda: Laroyê Exú!
EXÚ, O DONO DO TEMPO E DO MOVIMENTO
Segundo os fundamentos, Exú é a energia do movimento, do imprevisto, do que muda e faz mudar. Ele é o senhor da dinâmica do mundo. Seu arquétipo representa a maleabilidade da vida, a capacidade de adaptação, o riso diante da rigidez. Exú é irreverente, sim, mas com profundo propósito: ele desestabiliza o que está estagnado para que a transformação aconteça.
No jogo de búzios é ele quem leva as perguntas ao orum e traz as respostas de volta. Sua presença é essencial.
No sincretismo religioso, tão comum no Brasil, Exú foi muitas vezes confundido com o diabo cristão por causa de sua associação com a noite, os prazeres, a sexualidade e a ambiguidade moral. Mas esses são, na verdade, aspectos de sua natureza humana e divina: Exú não é bom nem mau, ele é o que for necessário para o equilíbrio. Ele representa o caos criador, aquilo que rompe para renovar.
POR QUE 13 DE JUNHO?
O dia 13 de junho, no catolicismo, é dedicado a Santo Antônio, com quem Exú foi sincretizado em muitos terreiros. Parece contraditório à primeira vista, mas há razões simbólicas profundas para isso.
Santo Antônio é conhecido como o “santo casamenteiro”, mas também como um santo popular simples, associado à fartura e à resolução de causas difíceis, assim como Exú. Ambos têm ligação com os desejos terrenos e com a solução de problemas práticos. Ambos, também, são cultuados com comidas e oferendas.
Além disso, Santo Antônio é conhecido por sua capacidade de mover aquilo que parece impossível, ajudando nos caminhos afetivos, financeiros e espirituais. Essa ponte simbólica com Exú se deu, principalmente, nos cultos afro-brasileiros que precisavam ocultar seus orixás sob figuras católicas durante os tempos de escravidão e repressão religiosa.
COMO É COMEMORADO O DIA DE EXÚ
No dia 13 de junho, terreiros por todo o Brasil celebram Exú com oferendas, cantos, danças e rituais específicos. É comum que se preparem comidas como padês (mistura de farinha de milho com dendê, às vezes com pimenta ou mel), farofa, pinga e charutos de repolho. As cores predominantes são o vermelho e o preto, que representam seus domínios.
Em algumas casas, os Exús também recebem oferendas nas encruzilhadas, locais sagrados de passagem e poder. Na umbanda, Exú é cultuado também como uma linha de trabalho espiritual, dividida entre Exús e Pombagiras, espíritos que, após viverem como humanos, trabalham agora com questões materiais, afetivas e espirituais.
Esses Exús de Umbanda não são orixás, mas entidades, e têm características mais individualizadas, com nomes próprios e histórias pessoais. Exú Caveira, Tranca-Rua, Marabô, Tiriri, Sete Encruzilhadas, e tantos outros, são exemplos disso. Essas entidades, sempre vistas com respeito, trabalham para desfazer demandas negativas, abrir caminhos e proteger aqueles que os procuram com fé.
EXÚ É LIBERDADE, CORAGEM E VERDADE
Falar de Exú no Brasil é também falar sobre resistência. É lembrar que, mesmo diante da opressão, da perseguição religiosa e do racismo, Exú permaneceu vivo, cantado, cultuado, celebrado. É reconhecer que sua imagem foi distorcida por séculos, e que agora, pouco a pouco, o resgate de sua dignidade sagrada está sendo feito.
Nas palavras do escritor, babalaô e professor Nei Lopes, “Exú é o princípio de tudo. Sem Exú, nem o orixá mais poderoso se manifesta”.
Celebrar Exú em 13 de junho é celebrar a vida que se movimenta, a comunicação que flui, a coragem de rir mesmo diante da tragédia. É lembrar que tudo começa na encruzilhada, e que é ali, no cruzamento dos caminhos, que Exú nos espera, com sua gargalhada sábia e seus olhos atentos.
GLOSSÁRIO ESSENCIAL
- Orum: mundo espiritual na cosmologia iorubá.
- Aiyê: mundo material, o plano da Terra.
- Padê: comida ritual feita para Exú, à base de farinha de milho.
- Laroyê: saudação a Exú, que pode ser entendida como “Salve Exú!” ou “Exú está presente!”.
- Sincretismo: fusão ou aproximação entre elementos de diferentes religiões.
“A sua casa não tem parede
Não tem janela e não tem nada
Oh, aonde é, aonde é que Exu mora?
Exu mora lá na encruzilhada
Aonde é, aonde é que Exu mora?
Exu mora lá na encruzilhada”
Laroyê, Exú! Seu povo não esquece de onde vem.
Publicado/Escrito/Desenhado/Editado: Bruno Zagati A.S.B. de Castro
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