Quando pensamos no Dia das Crianças, a primeira imagem que costuma vir à mente é a de presentes, doces e brincadeiras. Mas esta data, celebrada no Brasil, em 12 de outubro, guarda uma trajetória mais complexa, que atravessa debates sobre infância, vulnerabilidade social, cultura e políticas públicas. Vale a pena refletir: o que realmente significa esse dia para quem ainda vive a infância em meio a desafios, e também para nós, que um dia já fomos crianças?
De decreto centenário a data popular
Pouca gente sabe, mas o Dia das Crianças foi oficializado em 1924, pelo Decreto Federal nº 4.867, durante o governo de Artur Bernardes. A escolha da data foi inspirada pelo III Congresso Sul-Americano da Criança, realizado no Rio de Janeiro em 1923, e teve como articulador o deputado federal Galdino do Valle Filho. A proposta tinha um objetivo nobre: chamar atenção para temas como saúde, educação e bem-estar infantil.
A realidade, porém, era bem diferente. Naquele período, muitas crianças brasileiras não frequentavam a escola, começavam a trabalhar cedo e, em alguns casos, eram até presas por “vadiagem”. A infância, sobretudo para as camadas mais pobres, estava longe de ser protegida ou celebrada. Foi apenas a partir das décadas de 1950 e 1960 que o 12 de outubro ganhou o caráter popular e comercial que conhecemos hoje, impulsionado pela indústria de brinquedos e pelas campanhas publicitárias.
Entre o lúdico e o político: que infância celebramos?
Para nós, estudantes de Direito, o Dia das Crianças pode ser mais do que uma data festiva: é um convite à reflexão. Afinal, que infância idealizamos, e qual é o papel do Direito na construção desse imaginário?
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), de 1990, foi um marco ao consolidar a ideia de que crianças e adolescentes são sujeitos de direitos. Saúde, educação, lazer, dignidade e proteção não são favores: são garantias fundamentais que devem orientar tanto as políticas públicas quanto a forma como celebramos essa data.
Ainda assim, convivemos com realidades duras: trabalho infantil, abandono, negligência e desigualdade seguem presentes em várias regiões do país. A infância idealizada, com brinquedos, escola e afeto, coexiste com outra infância, muitas vezes invisível ao consumo e à mídia. Celebrar o Dia das Crianças, portanto, é também reconhecer essas disparidades e defender políticas que tornem efetivo o direito de ser criança em toda a sua plenitude.
Reflexão final para futuros operadores do Direito
Estudar o Direito da Infância e da Juventude nos mostra que o Dia das Crianças vai muito além de um gesto simbólico. É um exercício de memória, empatia e responsabilidade social. Para quem se forma na área jurídica, essa data é um chamado à crítica: pensar sobre os modelos de infância que o Estado e a sociedade constroem, e sobre o papel do Direito na proteção não apenas da criança “jurídica”, reconhecida nos textos normativos, mas também da criança real, que enfrenta desigualdades todos os dias.
Celebrar o 12 de outubro é, em última análise, lembrar que brincar, estudar e sonhar são direitos fundamentais, não privilégios. E que a efetivação desses direitos deve inspirar nosso compromisso com uma sociedade mais justa, sensível e verdadeiramente protetora de todas as infâncias.
Por Clara Neiva
Referências:
A imagem de destaque foi gerada por IA.
BRASIL. Decreto nº 4.867, de 5 de novembro de 1924. Institui o Dia da Criança. Diário Oficial da União, 1924.
CULTURA SP. Programação do Mês das Crianças. Secretaria da Cultura, Economia e Indústria Criativas do Estado de São Paulo. Disponível em: https://www.cultura.sp.gov.br/sec_cultura/Institucional/Noticias_da_Secretaria_da_Cultura/programacao_mesdascraincas_01.
SENADO FEDERAL. Dia da Criança surgiu há 100 anos, quando meninos pobres trabalhavam e iam para a cadeia. Agência Senado, Brasília, 2023. Disponível em: https://www12.senado.leg.br/noticias/especiais/arquivo-s/dia-da-crianca-surgiu-ha-100-anos-quando-meninos-pobres-trabalhavam-e-iam-para-a-cadeia.
Siga o JP3!
Mais notícias e informações:
- Dia do Mackenzista 2025
- Evento: Direito Societário, ESG e Arbitragem
- Outubro Rosa: mais do que uma cor, um alerta para a vida
- Filmes Esquecidos: “War of the Worlds: Next Century” e o Cinema Distópico de Piotr Szulkin
- Risco Sacado na Indústria do Varejo
O Jornal Prédio 3 – JP3, fundado em 2017, é o periódico on-line dos alunos da Faculdade de Direito da Universidade Mackenzie, organizado por alunos do curso e com contribuição de toda a comunidade acadêmica mackenzista. Participe!

Deixe um comentário