Assistir a “War of the Worlds: Next Century” (em polonês: Wojna światów – następne stulecie, 1981) não é uma tarefa fácil. Trata-se de uma obra um tanto solitária e satírica, marcada por um cenário distópico muito bem construído e realista, algo pouco comum em produções de ficção científica atuais. O filme polonês impressiona, sobretudo para quem está acostumado com a linguagem hollywoodiana ou britânica através da densidade das ideias e das mensagens que perdura após os créditos finais.
O longa foi dirigido e roteirizado por Piotr Szulkin, uma das vozes mais originais do cinema europeu. Szulkin desenvolveu sua carreira na famosa Escola Nacional de Cinema de Łódź, onde depois lecionou, e ficou reconhecido por alegorias provocantes e críticas ao autoritarismo. Sua filmografia, composta por longas, curtas e produções televisivas, lhe rendeu prêmios em diversos festivais internacionais, consolidando sua visão única de um cinema filosófico e existencial.
War of the Worlds: Next Century foi produzido às vésperas da decretação da lei marcial na Polônia, em dezembro de 1981, quando o governo impôs toque de recolher, censura absoluta e perseguição a jornalistas e intelectuais. Não à toa, a invasão alienígena funciona como alegoria direta ao controle totalitário e à manipulação midiática imposta pelo regime da época.
Trata-se de uma sociedade controlada pela mídia e pelo Estado, que recebe a visita de uma civilização marciana aparentemente amigável. O protagonista Iron Idem, interpretado magistralmente por Roman Wilhelmi, um dos grandes atores poloneses do pós-guerra, é um jornalista posteriormente forçado a colaborar com o sistema. A narrativa acompanha sua degradação moral: de âncora respeitado a porta-voz servil, até ser vendido como inimigo público. Sua trajetória não é apenas sobre resistência, mas também sobre a dificuldade de manter dignidade quando a verdade se torna mercadoria.
O filme expõe, com ironia, como o poder fabrica consenso, uma vez que os alienígenas quase não aparecem – isso porque não precisam. A simples presença simbólica deles, apresentados como “amigos”, já evoca o terror necessário para paralisar o telespectador. Quarenta anos depois, o longa se torna cada vez mais atual. Se antes era o governo que monopolizava a mentira, hoje ela se distribui em redes sociais. A lógica permanece: não é necessário que algo seja real, basta que seja compartilhado o suficiente. A máquina de propaganda apenas mudou de interface.
Além deste clássico distópico, Piotr Szulkin dirigiu outros títulos igualmente provocativos, como Golem (1980), O-Bi, O-Ba: The End of Civilization (1985) e Ga-Ga: Glory to the Heroes (1986). Em todas essas obras, nota-se a recusa de industrializar o cinema: Szulkin, para todos os efeitos, não produzia blockbusters.
War of the Worlds: Next Century sobrevive como um desses filmes esquecidos, cuja importância talvez supere sua fama ofuscada pelo tempo. Revisitar Szulkin hoje é relembrar que grandes narrativas nem sempre nasceram para serem sucessos de bilheteria; muitas delas foram criadas para nos fazer questionar aquilo que consideramos realidade.
Por Marina Bucciarelli
Referências:
A imagem de destaque é utilizada em material promocional do filme.
WOJNA ŚWIATÓW – NASTĘPNE STULECIE. Direção: Piotr Szulkin. Intérpretes: Roman Wilhelmi, Krystyna Janda, Mariusz Dmochowski. Polônia: Zespol Filmowy Perspektywa, 1981. MUBI.
The War of the Worlds: Next Century (1981) – Piotr Szulkin. Letterboxd, 2024. Disponível em: https://letterboxd.com/film/the-war-of-the-worlds-next-century/.
PIOTR SZULKIN. IMDb, 2025. Disponível em: https://www.imdb.com/pt/title/tt0083335/.
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