Por Natalia Reis
A Alumni Direito Mackenzie, associação dos antigos alunos da Faculdade de Direito do Mackenzie, possui diversas comissões temáticas que envolvem ex-alunos para discutir e produzir conteúdos acadêmicos e profissionais. Entre elas, está a Comissão de Direito Penal que, de tempos em tempos, divulga o projeto “Leitura Mackenzista”.
No texto abaixo, você confere a resenha do artigo “A substituição do código jurídico pelas normas políticas: um estudo do entendimento do supremo tribunal federal que equiparou as discriminações perpetradas contra a comunidade lgbtqiap+ ao crime de racismo”, de Lucas Henrique de Lucia Gaspar. A resenha é escrita pela advogada criminalista mackenzista Natalia Reis.
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Em seu artigo publicado na obra “Direito, Mídia e Liberdade de expressão: custos da democracia”, o autor Lucas de Lucia busca analisar o pronunciamento judicial sobre o crime do racismo, exarado pelo Supremo Tribunal Federal no âmbito da ADO nº 26/DF e do MI nº 4.733/DF, a fim de verificar se teria havido “a substituição do código jurídico pelas normas políticas e, caso positivo, qual viés ideológico teria sido aplicado”.
Isso porque, segundo o autor, a Corte Suprema, por maioria, (i) reconheceu a inércia do Legislativo em tentar salvaguardar a população LGBTQIAP+, em razão da ausência de regulamentação do art. 5º, XLI, da Constituição Federal de 1988; mas, para tentar criminalizar as ofensas e discursos do ódio proferidos à comunidade LGBTQIAP+, (ii) adotou uma interpretação extensiva do tipo penal do racismo, em uma possível relativização ao princípio da legalidade, para tipificar as condutas discriminatórias perpetradas contra membros deste grupo.
Antes de adentrar a análise do referido julgamento, o autor realiza um estudo prévio sobre a jurisprudência estadunidense, alemã e brasileira, a fim de constatar se a influência de ideais políticos é presente nos julgados que versam sobre atos discriminatórios. Da análise da jurisprudência estadunidense, o autor verifica a consagração da ideologia política do liberalismo e, por conseguinte, da liberdade de expressão. De outro lado, constata que os precedentes da Alemanha se alinham à corrente comunitarista, de modo a sobrelevar os direitos à honra e à dignidade, desde que estejam em consonância com os dogmas democráticos e com a funcionalidade da comunidade.
No cenário brasileiro, o autor discorre acerca do habeas corpus nº 82.959/RS, conhecido como caso Ellwanger, único precedente em que o STF, ao julgar sobre a responsabilidade penal de indivíduo condenado pela prática do crime de racismo (apologia ao nazismo), deliberou sobre os limites da liberdade de expressão em virtude da prática de discurso do ódio. De acordo com o autor, foi possível observar uma nítida influência política – tanto liberal, quanto comunitarista – nos votos de determinados ministros, em evidente substituição das normas jurídicas pelas sociais. Isso seria extremamente preocupante, ao seu ver, sobretudo no que se refere às discussões que tratam do direito penal, que deve ser sempre compreendido como “ultima ratio”.
Uma vez realizado esse estudo prévio, Lucas passa a analisar o julgamento da ADO nº 26/DF e do MI nº 4.733/DF pelo STF. Segundo o autor, os fundamentos utilizados para compreender pela possibilidade da subsunção da discriminação da população LGBTQIAP+ ao crime de racismo foram (i) a necessidade social de criação de hipótese legal para punir as condutas discriminatórias, a fim de que cesse o extermínio da referida população no Brasil; (ii) o eventual posicionamento contrário ou a inércia do órgão poderia levar à legitimação de discursos de ódio; (iii) a necessidade de um ato simbólico por parte de órgão do Estado, a fim de transmitir mensagem de que tais práticas preconceituosas não são toleradas; e (iv) a imperiosidade de consagrar o direito à dignidade e a honra dos membros do grupo LGBTQIAP+.
Assim, embora o autor reconheça que foi utilizada uma justificativa política comunitarista coerente no referido julgamento, sua principal crítica é no sentido de que as motivações políticas se sobrelevaram frente às exposições técnicas-jurídicas, de modo que o entendimento majoritário da Suprema Corte se pautou em viés ideológico – e não jurídico – com vistas a consagrar questões éticas e morais em uma tentativa de “fazer justiça”, sem, necessariamente, se valer de parâmetros estritamente legais. Na visão do autor, portanto, por mais nobre que seja a mencionada fundamentação política, não seria esse o papel do Judiciário, em especial, no âmbito penal.
Publicado por Luana Carvalho
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