por Beatriz Rodrigues B. Reis
A inteligência artificial vem sendo gradativamente inserida no contexto civil sistemas de segurança compostos por reconhecimento facial, nas assistentes virtuais, como Alexa, utilizada pela empresa Amazon, no diagnóstico de exames médicos, entre tantos outros ramos passíveis de sua aplicação. Neste cenário, a IA surge como uma potencial ferramenta para o marketing político e eleitoral, apoiando-se no processo de digitalização das relações sociais e das novas formas de produção e disseminação de informações é possível ver os reflexos da Inteligência artificial desde a gestão da imagem do candidato à análise do perfil dos eleitores.
No cenário internacional, as eleições presidenciais norte-americanas de 2016 que resultaram na eleição de Donald Trump, foram cobertas por polêmicas envolvendo a manipulação dos eleitores a partir da distorção de dados, fake news e difamação dos opositores. Uma das ferramentas para tal fim, foi o uso malicioso de “social bots”, softwares desenvolvidos agindo a partir de uma linha de código criada para simular ações humanas no mundo digital. Dessa forma, atuam através de perfis falsos automatizados capazes de disparar milhares de comentários em pouco tempo a favor ou contra um candidato, interagir com os demais usuários, salientar discussões e assim, obtém alto poder de influência sobre a política e a democracia de um país.
Nos Estados Unidos, de acordo com informações reveladas pelo Twitter, os social bots compartilharam as mensagens de Donald Trump 470 mil vezes no período final da campanha. Grupos russos, responsáveis por estes robôs, também utilizaram-se desta ferramenta a favor da candidata Hillary Clinton compartilhando 50 mil vezes. Uma pesquisa da Universidade Nacional da Austrália, revelou que estas contas e postagens falsas foram 2,5 vezes mais influentes do que as de humanos, pois possuíam a capacidade de alcançarem os usuários humanos influentes, gerando comentários e retuítes dos mesmos. Este tipo de estratégia, utilizada pelos candidatos, é capaz de gerar uma falsa dimensão de apoio popular, divulgar massivamente suas campanhas eleitorais e, desta forma, atrair eleitores reais.
No Brasil, as eleições de 2018 foram marcadas por uma grande polarização política, por um marketing eleitoral sem regras e limites envolvendo notícias falsas e manipulação de dados. Foi neste contexto que o uso destes robôs foi alavancado. Segundo estudo feito pelo Instituto InternetLab, na época, o então candidato à presidência, Alvaro Dias, possuía a maior porcentagem de seguidores robôs, 60% dos seus seguidores na rede social Twitter. Além disso, foi constatado que todos candidatos à presidência utilizaram esse sistema. À exemplo, Jair Bolsonaro com 34%, João Amoedo com 21% e Guilherme Boulos, com a menor porcentagem, 14%. Apesar da própria plataforma não autorizar, o mesmo estudo evidenciou que o Brasil possui a 8º maior população de bots do mundo, fruto da não fiscalização ativa. Conforme informado pelo próprio TSE, a fiscalização apenas ocorre em casos de denúncias do Ministério Público Eleitoral ou dos partidos lesados.
Com a aproximação das próximas eleições presidenciais de 2022, o alerta em relação ao uso dessa estratégia deverá ser aumentado pelos usuários das plataformas e por eleitores de maneira geral. Um estudo recente, realizado pela UFRJ e FespSP indicou, após a análise de 1,2 milhão de tuítes a favor do presidente Bolsonaro, que 55% das publicações foram realizadas por robôs. Prática que induz eleitores indecisos e gera uma falsa dimensão do apoio real do candidato.
Conforme apresentado, com a falta de um controle efetivo sobre o uso dos “social bots”, a prática desta estratégia cresce a cada período de eleição, propagando notícias falsas, influenciando eleitores em seu voto, além da sua potencial influência em criar um ambiente de mal estar social por muitas vezes, serem os pontos iniciais de discussões políticas e de evidente impacto no processo democrático de um país.
Apesar de não haver isenção da prática regulatória acerca do impulsionamento e uso de links patrocinados pelo marketing político (Resolução TSE nº 23.551/17 e Lei nº 13.488/17) os dados apresentados evidenciam uma defasagem em sua aplicação e um vácuo normativo que possibilita o avanço desta prática. O artigo 57-B, § 2º da Lei nº 9.504/97, proíbe a criação de perfis falsos em redes sociais para fins de veiculação de conteúdos de cunho eleitoral, entretanto não há nenhuma menção expressa quanto ao uso dos robôs sociais para fins políticos, caracterizados pela veiculação orgânica destes materiais. Enquanto os legisladores e magistrados eleitorais discutem formas de suprir essas lacunas, a população pode usar técnicas para identificação e combate a disseminação de notícias falsas publicadas pelos bots, como a apuração das informações recebidas e o não compartilhamento antes da checagem da veracidade das mesmas.
REFERÊNCIAS
“Twitter bots were 2.5 times more effective than humans in US presidential debate” por Zoey Chong. https://www.cnet.com/tech/services-and-software/twitter-bots-were-2-5-times-more-effective-than-humans-during-the-us-presidential-debate/#ftag=CADf328eec
“Bots e o Direito Eleitoral Brasileiro” por Carlos Augusto Liguori Filho. https://observa2018.dapp.fgv.br/wp-content/uploads/2019/01/Bots_Direito_Eleitoral_elei%C3%A7%C3%B5es_2018.pdf
“55% de publicações pró-Bolsonaro são feitas por robôs”. Publicado no Valor Econômico. https://valor.globo.com/politica/noticia/2020/04/03/55-de-publicacoes-pro-bolsonaro-sao-feitas-por-robos.ghtml
“Algoritmos ou inteligência artificial podem impactar nossas crenças nas eleições?” por OKBR. https://ok.org.br/noticia/algoritmos-ou-inteligencia-artificial-podem-impactar-nossas-crencas-nas-eleicoes/“Polarização Bolsonaro-Haddad impulsiona robôs” por O Estado de S. Paulo. https://politica.estadao.com.br/noticias/eleicoes,polarizacao-bolsonaro-haddad-impulsiona-robos,70002512129
Postado por Júlia Mayumi Oliveira
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Ótimo texto! retrata com muita clareza e assertividade esse problema da modernidade
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